Dor e revolta marcam despedida de Arthur, neto de Lula
Ex-presidente
participou do velório de seu neto de 7 anos em São Bernardo do Campo (SP) neste
sábado de carnaval.
Foto: Ricardo Stuckert |
Por Cecília Figueiredo e Lú Sudré - Brasil de Fato
02/03/2019
“Lula é minha família”, disse Lucas Henrique de Castro, jovem de 26 anos, chorando copiosamente num banco do cemitério Jardim da Colina, em São Bernardo do Campo, onde Arthur Araújo Lula da Silva, neto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi cremado neste sábado (2).
Assim como centenas de outras pessoas, incluindo
políticos e pessoas comuns, Lucas veio prestar solidariedade à família Lula da
Silva. Aos 7 anos de idade, Arthur faleceu ao meio dia dessa sexta-feira (1),
em decorrência de uma meningite meningocócica.
Detido na Polícia Federal de Curitiba desde 7 de abril de
2018, Lula foi autorizado a sair da prisão para se despedir de seu neto,
direito previsto no artigo 120 da Lei de Execução Penal (LEP). Abatido, o
ex-presidente chegou por volta das 11h deste sábado ao cemitério, onde desde
22h do dia anterior, seu neto estava sendo velado.
Lula estava sob forte aparato da Polícia Federal e
policiais da Rocam, além de dezenas de viaturas e policiais militares que
chegaram ao local mais cedo. Apesar da parede de policiamento e grades, a
população conseguiu ver o presidente acenar por alguns segundos antes de
ingressar no velório, que foi restrito a familiares e amigos. Durante uma hora
e meia em que esteve no velório, três helicópteros sobrevoavam o crematório, na
primeira vez em que o ex-presidente saiu do cárcere nesse um ano de prisão.
O sentimento dos presentes era de luto e de
solidariedade, mas também de indignação pela prisão de Lula, que em breve
completará um ano. A todo o momento, se escutava gritos que entoavam as
palavras “Arthur, presente!” e “Lula Livre!”.
A diarista Diana Dantas, moradora de São Bernardo do
Campo, não desgrudou da grade que separava o caminho por onde o presidente foi
conduzido. "Eu sou vó. É muito triste. Sou eleitora dele [Lula]. Eu sou
Lula. Vim prestar solidariedade e vê-lo também", lamentou.
Da mesma forma a ajudante geral, Patrícia Pereira, disse
que além da solidariedade, o que a trouxe foi o sentimento de amor a Lula. “Amo
muito o presidente Lula. Ele tá preso, mas continua sendo meu presidente",
afirmou.
Solidariedade
A militância teve de ser contida pelo presidente do
Instituto Lula, Paulo Okamoto, após a chegada do petista. Do lado de fora,
simpatizantes, amigos e moradores do entorno tinham a expectativa de ver o
ex-presidente.
Em entrevista ao Brasil
de Fato, Okamoto lamentou o fato de Lula ter que passar por tudo isso sob
essas condições. Okamoto considera "uma falha brutal da nossa
justiça" o fato de Lula ter sido impedido de ficar com sua família durante
o último ano.
Okamoto se mostrou desiludido com o Poder Judiciário
brasileiro, ao afirmar que resta apenas "acreditar na justiça divina,
porque a justiça dos homens está muito falha. É lamentável que um país como o
nosso tenha falhado tanto em promover a justiça. Nosso povo está muito
prejudicado".
Diversos políticos, integrantes de movimentos populares e
entidades sindicais estiveram presentes no velório. Entre os parlamentares, a
ex-presidente Dilma Rousseff, Fernando Haddad, Ivan Valente, Gleisi Hoffman,
Benedita da Silva, Rui Costa, Aloísio Mercadante, Eleonora Menicucci, Alexandre
Padilha, José Genoíno, Eduardo Suplicy, Guilherme Boulos, os irmãos Paulo e
Celso Frateschi, entre outros.
Cerimônia
“Hoje tivemos que cumprir um dos papéis mais difíceis que
a gente tem que fazer na vida. Acompanhar a despedida do presidente Lula de seu
netinho, de 7 anos, que já era bom de bola e partiu de forma trágica. A
determinação da Justiça Federal era que ele poderia ficar apenas uma hora e
meia no recinto, não poderia se manifestar com as pessoas que estavam aqui e
nem haver nenhuma manifestação política. Absurdo! Imagina se alguém vai num
velório fazer comício”, indignou-se João Pedro Stedile, da coordenação nacional
do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Durante a cerimônia, Lula contou, segundo o dirigente do
MST, que o menino vinha sofrendo muito bullying na escola por seu avô estar
preso.
“Lula fez um compromisso com o Arthur, botando as mãos em
cima do menino. Ele disse: ‘Eu prometo a você, ainda haverá justiça nesse
país’”, contou Stedile, que acompanhou o velório próximo ao ex-presidente. Ele
acrescentou que Lula pediu ao menino que levasse um abraço a Dona Marisa
Letícia e que ela cuidaria dele no céu.
Juliana Cardoso, vereadora eleita em São Paulo, também
lamentou a morte repentina Arthur. “A morte de uma criança é sempre muito
difícil. Ao mesmo tempo uma situação como essa, em que o presidente Lula chegou
fazia duas horas no Aeroporto de Congonhas e foi mantido lá, quando poderia
estar na despedida do neto”, afirmou.
Indignação
O ex-ministro da Casa Civil do governo de Dilma Rousseff,
Gilberto Carvalho, mostrou sua indignação em relação aos comentários de ódio
divulgado por alguns adversários políticos, como o deputado federal Eduardo
Bolsonaro (PSL).
“É um absurdo que nessa hora de tanta dor continuem
expressando um ódio que parece não ter fim. Queria pedir que Deus perdoe essas
pessoas e que ao mesmo tempo plante no coração delas pelo menos uma dúvida: se
é justo o que eles estão fazendo. Porque no dia, que Deus me livre, eles
perderem alguém nessas condições, eles vão saber a crueldade que estão fazendo
nesse momento".
Na mesma linha, Guilhermes Boulos, da direção do
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), ressaltou a importância de separar
a luta política das relações pessoais.
"Quando se comemora a morte de alguém, de uma
criança de 7 anos, não estamos mais falando de política, mas de caráter, de
humanidade. O que aconteceu ontem nas redes sociais serve como uma reflexão
para a sociedade: até que ponto nós chegamos? Abriram a porteira da
insanidade", enfatizou Boulos.
Em janeiro, após a morte do irmão do ex-presidente,
Genival Inácio da Silva, o Vavá, o pedido para saída da PF chegou ao Supremo
Tribunal Federal (STF), em decorrência das negativas em instâncias inferiores
da Justiça. Quando o ministro Dias Toffoli expediu a autorização, o velório de
seu irmão já havia ocorrido e Lula decidiu não deixar a PF, considerando-se
impedido pelo Poder Judiciário de participar desse momento, conforme prevê a
legislação brasileira.
Arthur foi cremado no mesmo local onde foi cremada há
dois anos a esposa de Lula, Marisa Letícia.
Edição:
Luiz Felipe Albuquerque – Brasil de Fato
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